Sou uma miúda com sorte

Sou uma miúda com um bocado de sorte. Sempre tive tudo o que queria, sem nunca lutar muito pelas coisas. Bastava insistir um pouco, explicar as minhas razões, sempre certas claro, e esperar que me concedessem os desejos como se todo o mundo fosse a minha fada-madrinha que agitava a varinha de condão e tornava tudo possível.
Tenho sorte porque as únicas mortes que presenteei foram as minhas, da alma, quando um amor muito grande deixava de ter ar por onde respirar, e aí eu vertia a minha alma pelos olhos, escrevia ainda mais e o meu mundo parecia um desabamento mesmo por baixo dos meus pés. Mas como tenho sorte e sou p'ra lá de optimista, penso que o tmpo cura tudo e quando não cura, acalma, e então a minha alma toa amachucada voltava aos poucos para o meu pequeno corpo e me tentava dizer que ia ficar tudo bem. E aí, quando a alma voltava meio tímida, eu dava-lhe festas, ela ia ficando outra, outra vez toda direitinha, como passada a ferro, porque é o que o tempo nos ensina: a enterrar os mortos e cuidar dos feridos, aqueles que se ferem na batalha que é o amor. E é verdade, nessa batalha perde-se um bocado do que se era porque eu acho que todos nós perdemos um bocado de nós quando uma relação, que foi outrora cheia de amor, falha. Porque amar é encontrar um bocado de nós e o outro encontrar um bocado de si, é dar um outro bocado daquilo que somos ao outro e ele, por sua vez, dar-nos um bocado de si a nós, para guardarmos no coração, que é o sítio onde guardamos tudo o que não queremos esquecer e não deixar de sentir. É, sobretudo, o sítio onde guardamos tudo o que é importante para nós, tudo o que, de certa forma, nos torna pessoas.
E é por isso que quando uma relação acaba, um bocado de nós se vai. Deve ser por isso que ficamos com aquela sensação de vazio e de impotência, porque alguém roubou um bocado do nosso coração, da nossa essência.
O coração, como é de carne e é muito vivo, mesmo quando sangra todo o sangue quanto a alma e o corpo têm, lá arranja maneira de se curar e sarar as feridas.
Mas tudo isso só lá com tempo. Tempo e paciência. Que um coração partido que amou demais, demora sempre mais a sarar.
Eu sou uma miúda com sorte, porque cresci a acreditar no amor acima de qualquer Deus ou força ou coisa que me valha! O Amor está antes e depois de tudo, porque somos feitos com amor, para amar. Eu pelo menos fui, mas também tenho sorte nesse aspecto. Acho que nunca levei uma tampa que me pusesse tão de rastos, sempre fui forte e sempre ultrapassei tudo. Sou esperta, tenho um tanto de culta quanto a cultura geral (só não me podem perguntar Geografia!), interesso-me por montes e montes de coisas diferentes e isso faz com que seja desenrascada e conversadeira. Esta coisa é que pode ser um defeito ou uma virtude, o gostar de conversar, conhecer novas pessoas e as suas ideias, mesmo sem ter segundas intenções!
Sou uma miúda com sorte porque me apaixono a sério e dou tudo o que tenho e o que não tenho, tudo o que posso e o que não posso, cometo loucuras e nem por um segundo me questiono se é o correcto! Tenho sorte porque sei amar de verdade, sei mostrar o quanto, dou presentes e mimos porque quero, dou apoio, estou sempre pronta a ouvir ou a dar o meu ombro, o meu abraço. Preocupo-me sempre mais com o outro que comigo própria, porque se o outro não estiver bem, eu também não estou, porque o outro é, no fundo, um bocado de mim também.
Sou uma miúda cheia de sorte e, por enquanto, estou bem assim!


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