Nostalgia da minha querida António Arroio

"A simplicidade. Só o que é útil é bonito. O fútil é desagradável." Vítor da Silva, meu Professor de Artes Gráficas. Há coisa de trinta anos, um aluno qualquer armado em artista, subiu a um escadote e pintou espontaneamente sobre a porta principal da escola um AMO-TE com um "A" de anarca, e o graffiti ali se deixou ficar até hoje, resistindo a obras remodelações e reconfigurações. Acham isto normal? É claro que não. A António Arroio não é uma escola normal! Conheci várias escolas, umas melhores do que as outras, mas nenhuma como aquela. É complicado para qualquer "Arroiano" explicar o que tem aquela escola de diferente das outras em concreto, mas o mais notável de tudo era uma estranha cumplicidade criativa entre alunos, docentes e até o pessoal auxiliar, mesmo à revelia das normas, um direito à diferença tão enraizado e natural que não se dava pela "diferença", e essa maneira de estar na escola, de viver a escola como um espaço de criação, será provavelmente o factor que mais marca a António Arroio. A envolvência era tal que a escola acabava por sermos nós mesmos, e isso fazia com que nos sentíssemos parte integrante dela. Um todo. Ninguém ficava de fora. Era impossível. Também lá aprendi que "Loukura é Formosura". Quando lá cheguei em 1980 o @MO-TE era o original e estava pintado na parte da platibanda hoje ocupada pelo painel de azulejos do professor Querubim Lapa e aquilo era uma espécie de Staatliches Bauhaus à Portuguesa. Nunca mais me consegui desligar dela. O meu maior e mais antigo amigo é professor naquela escola e uma boa fatia das minhas relações têm algum tipo de ligação com ela. Voltar lá de surpresa quase trinta anos depois e ser acolhido pelo velho Matias com tanto calor e simpatia, foi no mínimo uma prova inequívoca de que eu não "inventei" a António Arroio. Ela é mesmo assim. Caminhar por aqueles corredores desertos numa tarde de férias da Páscoa a deixar exorcizar uma infinidade de detalhes que guardo como se fossem um grande tesouro, foi algo verdadeiramente íntimo e deslumbrante. O Vítor da Silva e resmungar que "os apara-lápis eram uma invenção da industria para vender mais lápis", o baldar-me a aulas minhas para ir assistir às aulas de História d'Arte da Natalina noutras turmas (as aulas dela esgotavam plateias), o Manel que em vez de dar aulas de filosofia levava com elas (ele próprio o cultivou em nós e estamos gratos por isso), as tardes a pintar paredes na "Alameda das Ganzas", as bicas prolongadas e eloquentes no Louvre, os matraquilhos no "Jardim da Celeste", tudo isso e muito mais da António Arroio, fizeram de mim uma pessoa muito melhor, e é por isso que lhe estou eternamente reconhecido e a trago no coração, e faço minhas as palavras do owner quando diz "Esta é a MINHA escola, como nenhuma outra foi". É a pura verdade. Ocorre-me citar aqui este pequeno texto de uma professora para uma aluna da escola. Poderá porventura parecer algo naïf, mas traduz muito bem o espírito "Arroiano": "Aquele Amo-te que está pintado à porta da nossa escola é uma mensagem que só quem vive ou viveu na António Arroio consegue compreender. Naqueles corredores há uma melodia que só nós conseguimos ouvir. Naquelas salas há uma luz que só nós conseguimos ver. Naquelas oficinas há texturas que só nós conseguimos sentir. Naqueles canteiros há flores e árvores que na Primavera enchem o ar com cheiros que são só nossos. Porque aquela escola é um lugar diferente. Talvez por isso é que ninguém quer sair de lá...mesmo os antigos alunos voltam sempre para uma visita." in "uccello", de Ana Martins, ucelo.blogspot.com, docente de História de Arte, 2008. Eu também voltei, ou talvez não... Talvez uma boa parte de mim nunca tenha de lá saído. Muito obrigado por me fazeres lá voltar. Foi absolutamente único!

autor desconhecido, encontrei aqui.

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